segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Horas Rubras




Horas profundas, lentas e caladas
Feitas de beijos rubros e ardentes,
De noites de volúpia, noites quentes
Onde há risos de virgens desmaiadas...

Oiço olaias em flor às gargalhadas...
Tombam astros em fogo, astros dementes,
E do luar os beijos languescentes
São pedaços de prata pelas estradas...

Os meus lábios são brancos como lagos...
Os meus braços são leves como afagos,
Vestiu-os o luar de sedas puras...

Sou chama e neve e branca e misteriosa...
E sou, talvez, na noite voluptuosa,
Ó meu Poeta, o beijo que procuras!

Florbela Espanca, in "Livro de Sóror Saudade"

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

“E foi nesse segundo que Tadzio sorriu, que lhe lançou um sorriso eloqüente, intimo. Encantador, aberto, que só lentamente lhe descerrava os lábios. Era o sorrir de Narciso debruçado sobre o espelho da água, aquele sorriso profundo, enfeitiçado, enlevado, com o qual estende os braços à margem da própria beleza. Um sorriso um tanto forçado, desfigurado pela inutilidade do desejo de beijar os lindos lábios da sua sombra, sorriso coquete, curioso, levemente inquieto; sorriso seduzido e sedutor.”
Vou pedir a titia que vista uma roupa de fada e me transforme num peixe. Deve ser boa a vida de peixe de aquário, murmurei.
- Deve ser fácil. Aí eles ficam dia e noite, sem se preocupar com nada, há sempre alguém para lhes dar de comer, trocar a água... Uma vida fácil, sem dúvida.
Mas não boa. Não se esqueça de que eles vivem dentro de um palmo de água quando há um mar lá adiante.
- No mar seriam devorados por um peixe maior mãezinha.
- Mas pelo menos lutariam. E nesse aquário não há luta, filha.
Nesse aquário não há vida.”

Lígia Fagundes Telles, Verão no Aquário, cap IX, pág 131.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012